CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ NORMAS PASTORAIS SOBRE AS ABSOLVIÇÕES COLETIVAS * Cristo, Nosso Senhor, instituiu o sacramento da penitência para que os fiéis pecadores obtivessem da divina misericórdia o perdão das ofensas feitas a Deus e pudessem, ao mesmo tempo, reconciliar-se com a Igreja (cf. Lumen gentium, 11). Fez isto ao comunicar aos Apóstolos e a seus legítimos sucessores o poder de perdoar e reter os pecados (cf. Jo 20, 22s). O Concilio de Trento declarou, solenemente, que para a remissão integra e perfeita dos pecados, exige-se do penitente três atitudes que compõem o sacramento, a saber: a contrição, a confissão e a satisfação; disse, ainda, que a absolvição dada pelo sacerdote é um ato de ordem judicial e que, por direito divino, torna-se necessário confessar ao sacerdote todos e cada um dos pecados mortais, bem como as circunstancias que modificam a espécie destes pecados, das quais recorde-se após diligente exame de consciência (cf. Sessão XIV, Cânones do sacramento da penitência 4,6-9; DS, n. 1704,1706-1709). Pois bem, muitos Ordinários do lugar estão preocupados, por um lado, com a dificuldade que encontram seus fiéis em aproximar-se da confissão individual, devido a escassez de sacerdotes em algumas regiões; e por outro, com a difusão de algumas teorias errôneas sobre a doutrina do sacramento da Penitência, bem como com a crescente propensão e prática abusiva de ministrar a absolvição sacramental a muitos simultaneamente, somente genericamente confessados. Por isso, se dirigiram à Santa Sé pedindo que, segundo a verdadeira natureza do sacramento da Penitência, se recorde ao povo cristão as condições necessárias para o reto uso deste sacramento e que se deem algumas normas a respeito nas atuais circunstâncias. Esta S. Congregação, depois de uma seria reflexão sobre tais questões e considerando a Instrução da S. Penitenciaria Apostólica de 25 de março de 1944, declara o seguinte: I Há que manter-se com firmeza e aplicar-se fielmente a prática da doutrina do Concílio de Trento. Consequentemente, há que se reprovar o costume surgido recentemente em diversos lugares, segundo o qual se pretende satisfazer o preceito de confessar sacramentalmente os pecados mortais para obter a absolvição mediante uma única confissão genérica, ou, como dizem, celebrada comunitária ou coletivamente. Além do preceito divino declarado no Concílio de Trento, exige-o também o maior bem das almas que, segundo pode-se comprovar por experiência secular, consegue-se com a confissão individual retamente feita e administrada. A confissão individual e completa, seguida da absolvição é o único modo ordinário, é por ele que os fiéis podem reconciliar-se com Deus e com a Igreja, a não ser que uma impossibilidade física ou moral os escuse de tal confissão. II Pode suceder de fato que alguma vez, em circunstâncias particulares, seja lícito, e inclusive conveniente, ministrar a absolvição de um modo geral a muitos penitentes sem a prévia confissão individual. Isto pode ocorrer, sobretudo, quando há a ameaça de um perigo iminente de morte e não há tempo para que o sacerdote ou os sacerdotes, mesmo estando presentes, possam ouvir em confissão a cada um dos penitentes. Em tal caso, qualquer sacerdote tem a faculdade de dar a absolvição de maneira geral a muitas pessoas, fazendo antes, se houver tempo, uma brevíssima exortação para que cada um procure fazer um ato de contrição. III Além dos casos de perigo de morte, é lícito dar a absolvição sacramental a muitos fiéis simultaneamente que tenham feito confissão somente de modo genérico, mas convenientemente exortados ao arrependimento, se houver grave necessidade; quer dizer, quando, dado o número de penitentes, não houver suficientes confessores para ouvir na devida forma as confissões de cada um em tempo razoável e, por conseguinte, os penitentes se vejam obrigados, sem culpa sua, a ficar privados por longo tempo da graça sacramental ou da sagrada Comunhão. Isto pode acontecer, sobretudo, em missões e também em outros lugares, assim como em certos grupos de pessoas onde ocorrer essa necessidade. Contudo, isto não é lícito quando há confessores disponíveis, pelo simples fato de uma grande ocorrência de penitentes, como pode suceder, por exemplo, em uma grande festa ou peregrinação (cf. Prop. 59, condenada por Inocêncio XI em 2 de março de 1679: DS, n. 2159). IV Os Ordinários de lugar e os sacerdotes, naquilo que a estes diz respeito, estão obrigados, com grave ônus de consciência a providenciar que não seja insuficiente o número de confessores pelo fato de que alguns sacerdotes descuidem deste sublime ministério (cf. Presbyt. Ord. 5,13; Christ. Dom. 30), dedicando-se a assuntos temporais ou a outros ministérios menos necessários, sobretudo se estes podem ser atendidos por diáconos ou seculares idôneos. V Fica reservado ao Ordinário de lugar, depois de ter sido assessorado por outros membros da Conferência Episcopal, julgar se são dadas as condições assinaladas acima (n. III) e, portanto, decidir quando se pode dar a absolvição sacramental coletiva. Além dos casos determinados por ordem do Ordinário do lugar, se apresentar-se outra necessidade grave de dar a absolvição sacramental a muitos simultaneamente, o sacerdote está obrigado a recorrer previamente ao Ordinário do lugar, sempre que for possível, para poder dar licitamente a absolvição; em caso contrário, deverá informar ao mesmo Ordinário, o quanto antes, sobre tal necessidade e sobre a absolvição dada. VI No que se refere aos fiéis, para que possam beneficiar-se da absolvição sacramental dada coletivamente, se requer absolutamente que estejam dispostos, quer dizer, que cada um esteja arrependido de seus pecados, tenha o propósito de emenda, esteja decidido a reparar os escândalos ou danos eventualmente causados e por sua vez se proponha a fazer, em seu devido tempo, a confissão de todos e de cada um dos pecados graves que no momento não pode confessar dessa maneira. Os sacerdotes deverão instruir diligentemente os fiéis sobre estas disposições e condições necessárias para a validez do sacramento. VII Aqueles a quem forem perdoados os pecados graves com uma absolvição comum deverão fazer uma confissão auricular antes de receber nova absolvição coletiva, a não ser que estejam impedidos por uma causa justa. De qualquer maneira, estão obrigados absolutamente a procurar dentro de um ano a um confessor, a não ser que estejam impedidos por impossibilidade moral. Pois está vigente também para eles o preceito pelo qual todo cristão está obrigado a confessar privadamente a um sacerdote, ao menos uma vez por ano, os próprios pecados; se entende os pecados graves que não havia ainda confessado singularmente (cf. Concílio Lateranense IV, cap. 21, com o Concílio de Trento, Doutrina sobre o Sacramento da Penitência, cap. 5, sobre A Confissão, e cán. 7-8: DS, n. 812; 1679-1683 e 1707-1708; cf. também a Prop. 11 condenada pela S. C. do S. Ofício, no Decr. de 24 de setembro de 1665: DS, n. 2031). VIII Os sacerdotes ensinem aos fiéis que, aos que tem consciência de estar em pecado mortal e têm a disposição algum confessor, fica proibido para eles evitar intencionalmente ou por negligência o cumprimento da obrigação da confissão individual, esperando uma ocasião em que se dê a muitos a absolvição coletiva (cf. Instrução da S. Penitenciaria Apostólica de 25 de março de 1944). IX Para que os fiéis possam cumprir facilmente com o dever da confissão individual, procure-se que se encontre nas igrejas confessores disponíveis em dias e horas determinadas, levando em consideração a comodidade dos fiéis. Nos lugares afastados ou de difícil acesso, onde o sacerdote raramente pode aproximar-se durante o ano, disponham-se as coisas de tal maneira que o sacerdote, o quanto for possível, ouça cada vez as confissões sacramentais de alguns penitentes, dando aos demais, se forem cumpridas as condições indicadas acima (cf. n. III), a absolvição sacramental coletiva; de tal modo, não obstante que todos os fiéis, se for possível, possam confessar-se individualmente ao menos uma vez por ano. X Esclareça-se vivamente aos fiéis que as celebrações litúrgicas e os ritos penitenciais comunitários são de grande utilidade para preparar com muito proveito a confissão dos pecados e a emenda de vida. Tenha-se muito cuidado, contudo, de que tais celebrações e ritos não sejam confundidos com a confissão sacramental e a absolvição. Se, dentro destas celebrações, os penitentes fizeram a confissão individual, cada um deve receber individualmente a absolvição do confessor que escutou sua confissão. Mas, no caso em que se ministre a confissão sacramental a muitos, simultaneamente, esta deverá ser sempre ministrada segundo o rito peculiar estabelecido pela Sagrada Congregação para ao Culto Divino. Entretanto, até a promulgação deste novo rito, se usará no plural a fórmula da absolvição sacramental atualmente prescrita. A celebração deste rito deve estar totalmente separada da celebração da Missa. XI Aquele que é motivo atual de escândalo para os fiéis, se está sinceramente arrependido e se propõe realmente a remover o escândalo, pode receber, sem dúvida, a absolvição sacramental coletiva com os demais; não obstante, não poderá aproximar-se da Sagrada Comunhão enquanto não tiver feito desaparecer o escândalo conforme o juízo de um confessor, ao qual antes, deve recorrer pessoalmente. Quanto à absolvição das censuras reservadas, há que se observar as normas do direito vigente, computando o tempo para o recurso a partir da próxima confissão individual. XII No que se refere à prática da confissão frequente ou de “devoção”, os sacerdotes não dissuadam dela os fiéis. Pelo contrário, ponderem os frutos abundantes que trazem para a vida cristã (cf. Mystici Corporis, AAS 35 (1943) 235), e mostrem-se sempre dispostos a ouvir em confissão aos fiéis que o peçam razoavelmente. Deve-se evitar absolutamente que a confissão individual fique limitada unicamente aos pecados graves, uma vez que isto privaria os fiéis do excelente fruto da confissão e depreciaria a boa fama dos que se aproximam individualmente do sacramento. XIII Deve-se considerar abusos graves as absolvições sacramentais dadas coletivamente sem observar as normas precedentes. Todos os pastores devem evitar cuidadosamente tais abusos, conscientes de sua própria responsabilidade diante do bem das almas e de velar pela dignidade do sacramento da penitência. O Sumo Pontífice Paulo VI, na audiência concedida ao infraescrito Cardeal Prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé em 16 de junho de 1972, aprovou de modo especial estas normas e mandou promulga-las e que entrarão imediatamente em vigor. Roma, na sede da Congregação para a Doutrina da Fé, 16 de junho de 1972. Francisco Card. Šeper Prefeito Pablo Philippe Secretário
* AAS 64 (1972), 510-514. |