I Encontro Internacional para a Pastoral
dos Meninos de Rua
Roma, 25-26 de outubro de 2004
Documento final
O evento
Realizou-se na sede do Pontifício Conselho da Pastoral para os Migrantes e os Itinerantes, em Roma, o I Encontro Internacional para a pastoral dos meninos de rua. Participaram no mesmo, além dos Superiores do Pontifício Conselho e dos seus dois Oficiais do setor, dois Bispos e vários sacerdotes, religiosos/as e leigos representantes das Conferências Episcopais de 11 Nações Européias, quer dizer, Alemanha, Áustria, Espanha, Estônia, Federação Russa, Hungria, Irlanda, Itália, Polônia, Portugal, e República Checa além dos de 7 países de outros continentes, incluindo os expertos, isto é, de Bolívia, Brasil, Congo R.D., Filipinas, Índia, México e Peru. Estavam presentes também, além do Secretário Geral da Caritas internacional, delegados de “Kindermissionswerk” (Alemanha) e representantes da Congregação Salesiana, das Irmãs do Bom Pastor e dos Irmãos das Escolas Cristãs.
Foi enviada pelo Santo Padre uma Mensagem de encorajamento aos participantes à reunião, a qual, com um telegrama do Em.mo Sr. Cardeal Angelo Sodano, Secretário de Estado, enviou uma saudação de boas vindas e formulou calorosos votos para o bom êxito do Congresso. O texto recorda a predileção do Divino Mestre para com os pequenos, em favor dos quais “o Santo Padre deseja que o providencial encontro contribua para formular propostas concretas de eficazes intervenções de acolhida e assistência à juventude em risco, para os sem casa e sem família, para a tutela dos direitos e da dignidade de cada menino e menina em dificuldade”. Para confirmar “tal necessidade da ação social e religiosa”, Sua Santidade assegurou a todos os participantes uma oração propiciadora para os que dedicam-se a evangelizar o mundo juvenil assim como para aqueles que são confiados aos seus cuidados.
Iniciaram-se os trabalhos depois de uma calorosa saudação do Presidente do Pontifício Conselho, o Em.mo Sr. Cardeal Stephen Fumio Hamao e sua conferência sobre o tema: “Os meninos, inclusive os da rua, à luz dos recentes ensinamentos de João Paulo II”. Ele ressaltou a importância do fenômeno em questão, que solicita a atenção e a caridade pastoral da Igreja Universal e das Igrejas locais. Em particular – afirmou o Sr. Cardeal – “a rua torna-se lugar de planificação de uma pastoral específica para os meninos que vivem nela”.
O Arcebispo Agostino Marchetto, Secretário do Dicastério, apresentou alguns critérios de avaliação a respeito do fenômeno dos meninos de rua, com a sua intervenção intitulada:
‘A Pastoral de acolhida’ a favor dos meninos de rua. O Arcebispo salientou um vasto e importante campo de apostolado que requer também novos objetos-sujeitos pastorais. Referia-se com preocupação sobretudo aos meninos e às meninas, muitos dos quais vivem também nas entranhas das grandes e frias cidades.
As intervenções sucessivas dos participantes à reunião colocaram em evidência vários aspectos da atual “realidade” da rua. Para ela a Igreja olha com simpatia e convida a acolher os valores espirituais e teológicos subjacentes a um empenho pastoral que revela a benevolência de Deus em relação aos meninos de rua, conscientes, todos, de tragédias que estão submetidas a tal experiência. Por isso a especial preocupação para o dramático número crescente de meninos de rua e na rua, da qual deriva, com urgência, a necessidade de uma ação pastoral, além das laudáveis iniciativas de assistências que existem atualmente, e da dificuldade de incluir tal ação nas atuais estruturas eclesiais.
A conferência do Prof. Mario Pollo, intitulada: “A Pastoral dos meninos de rua” (visão de conjunto), ofereceu um quadro geral da situação, tirado das respostas ao questionário a seu tempo enviado a todos os participantes. Desse resulta justamente uma certa carência do aspecto mais especificamente pastoral de quanto até agora tem sido feito.
Durante a Mesa redonda, com a participação de 6 expertos, procurou-se, “colocar as grandes linhas de uma pastoral específica”.
No final deste Encontro Internacional, depois de trocas de notícias, opiniões e aprofundamento, se tomou nota, com gratidão, de interessantes iniciativas já existentes, contando com a diversidade de situações pastorais nos diferentes países. Reafirmando o propósito de prosseguir no trabalho empreendido nestes dois dias, os participantes examinaram “táticas” e “estratégias” para o futuro, metodologias e objetivos que foram resumidos neste documento final.
Conclusões
1. Sem dúvida, os meninos de rua constituem um dos desafios mais comprometidos e inquietantes do nosso século também para a Igreja, além de que para a sociedade civil e política. Se está diante de um fenômeno de insuspeitável amplitude inclusive para as instituições públicas: um povo de cerca de 100 milhões de meninos, segundo as estimativas de “Amnesty International” (150 milhões ao dizer da organização Internacional do Trabalho); além disso, um fenômeno em crescimento em quase toda parte: isto implica uma verdadeira e própria emergência social, além da pastoral.
2. Constatou-se que, mesmo, quando as instituições públicas manifestam claro conhecimento da gravidade do fenômeno, não se mobilizam adequadamente para traduzi-lo em intervenções eficazes de prevenção e recuperação. freqüentemente, na sociedade civil, a atitude prevalente é aquela de alarme social, porquê, tem diante de si uma ameaça à ordem pública. Portanto, existe uma preocupação maior com a proteção pessoal perante o perigo constituído pelos meninos de rua, do que uma disposição de ajudá-los; é pois difícil fazer emergir o sentido humanitário e solidário do problema, e, mais ainda, o sentido cristão diante do mesmo.
3. Durante o Encontro resultou claramente que os meninos de rua, em estreito sentido, são privados de vínculos com o seu próprio núcleo familiar de origem, isto é, os meninos que fizeram da rua a sua habitação, com freqüência são obrigados a dormir na mesma, e, entre eles notou-se uma vasta gama de situações. Dito sumariamente, no assunto existe quem sofreu a experiência traumatizante de uma família destruída e ficou sozinho, e quem foi expulso ou fugiu de casa por ser demasiado esquecido, descuidado ou maltratado. Existem também, aqueles que rejeitam a casa ou dela são rejeitados porque estão comprometidos com várias formas de “marginalização” (drogas, álcool, furto e outros expedientes para sobreviver). Por outro lado, muitos são induzidos com promessas, seduções ou violências, por parte de adultos ou de clãs de má vida, a permanecer na rua, coisa que freqüentemente acontece para jovens estrangeiras obrigadas a prostituir-se ou para menores estrangeiros não acompanhados e obrigados a mendigar. Estes meninos experimentam na sua vida a interferência das forças de ordem e o cárcere. Nos países em via de desenvolvimento é impressionante o número de meninos que entram nesta categoria.
4. Diferente da categoria precedente é aquela dos “meninos na rua”, isto é, daqueles que transcorrem grande parte do seu tempo na estrada, mesmo não sendo privados de “casa” e de um vínculo com a família originária. Eles preferem viver o dia, com escassa ou nenhuma responsabilidade para a formação e para o futuro, em grupos pouco recomendáveis, geralmente fora da família, até mesmo se nela ainda possam encontrar um lugar para dormir. O número deles é preocupante inclusive nos países desenvolvidos.
5. Numerosas são as causas à base deste fenômeno social de dimensões sempre mais alarmantes. Entre as principais foram indicadas as seguintes:
- a crescente desagregação das famílias, situações de tensões entre os pais, comportamentos agressivos, violentos e às vezes perversos em relação aos filhos;
- a emigração, com quanto comporta de desenraizamento do contexto habitual de vida e conseqüente desorientação;
- as condições de pobreza e de miséria que mortificam a dignidade e privam do indispensável para a vida;
- o aumento da tóxico-dependência e do alcoolismo;
- a prostituição e a indústria do sexo, que continua a fazer um número impressionante de vítimas, freqüentemente induzidas com violências alucinantes às escravidões mais ferozes;
- as guerras e as desordens que transtornam inclusive para os menores a normalidade da vida;
- o difundir-se, sobretudo na Europa, de uma “cultura da tóxico dependência e da transgressão”;
- a falta de valores de referência, a solidão e um sentido cada vez mais profundo de vazio existencial que caracterizam o mundo juvenil em geral.
6. Quanto mais se apresenta alarmante a entidade do problema e carente de presença efetiva dos poderes públicos, tanto mais se reconhece apreciável e precioso, em matéria, a intervenção do social privado e do voluntariado. O associacionismo de área eclesial e de inspiração cristã resulta ativo e eficiente, todavia é absolutamente inadequado diante da amplitude das necessidades e, ainda mais, destacado de uma pastoral orgânica específica. Notou-se assim, que as Dioceses e as Conferências Episcopais nacionais não assumem suficientemente este problema, isto é tanto no que diz respeito à prevenção quanto à recuperação dos meninos. Existem todavia realizações positivas, que são de encorajamento e estímulo para quem considere que o terreno é muito ingrato para investir nele maiores energias.
7. No decorrer do Encontro constatou-se que na maioria dos casos as atividades são planejadas e levadas adiante por agentes profundamente motivados e profissionalmente bem preparados, em relação aos responsáveis de tais iniciativas, bem como o corpo de voluntários.
8. Contudo na variedade de planejamentos, parece que foi encontrado uma substancial concordância de objetivos, quer dizer:
- recuperar o menino de rua a uma vida normal, que comporte a sua re-inserção na sociedade, mas sobretudo num ambiente de família, de preferência na sua família de origem ou noutra, ou ainda, numa estrutura comunitária, mas sempre de tipo familiar;
- levar o menino a ter confiança em si mesmo, à auto-estima, ao sentido da sua dignidade e conseqüente responsabilidade pessoal;
- fazer nascer nele o autêntico desejo de retomar um currículo escolar e de preparar-se profissionalmente para uma inserção de trabalho na sociedade, de maneira que possa desenvolver, com suas próprias forças e não somente na dependência de outros, dignos e gratificantes projetos de vida.
9. As tipologias de intervenções em favor dos meninos de rua resultaram diferentes e muito variadas, como:
- o assim chamado compromisso na rua, que prevê o contato com os meninos nos lugares de reunião, a fim de estabelecer uma relação empática e de confiança que consinta aos meninos em dificuldade e na “marginalização” uma abertura para o educador;
- os centros diurnos orientados à promoção de condições essências a fim de que os meninos possam viver com dignidade;
- as iniciativas de apoio para a satisfação das necessidades primárias: mesa, roupa e assistência sócio-sanitária;
- as estruturas educativas e formativas: educação infantil, escola, cursos de formação profissional;
- os centros de acolhida residencial, onde recebe-se também instrução e formação, mas sobretudo onde se faz o acompanhamento humano com o suporte inclusive das disciplinas psico-pedagógicas. Em certos casos realiza-se também um acompanhamento espiritual, baseado no Evangelho, com o compromisso de um caminho responsável de reconstrução interior e de cura do coração;
- a atividade orientada à re-inserção do menino no núcleo originário de pertença ou em novas comunidades de adoção;
- a atividade de maior dimensão que chegue até a sociedade civil e eclesial, não simplesmente para informar, mas para sensibilizar e envolver principalmente na obra de prevenção do fenômeno e do apoio os meninos restituídos ao seu ambiente natural;
- os cursos de formação e de atualização para agentes e voluntários, a fim de garantir em todos uma séria profissionalização.
10. Quanto ao método, as manifestações fundamentais que apareceram no decorrer do Encontro são estas:
- trabalho em equipe de todos os agentes;
- compromisso paralelo de apoio aos pais, em caso de poder contatá-los e de serem disponíveis à colaboração;
- re-inserção na escola e na formação profissional;
- construção e aumento de redes de amizades, também fora das estruturas de acolhida;
- grande importância às atividades lúdicas, esportivas e todas aquelas que estimulam o menino a assumir papéis ativos de responsabilidade e criatividade.
11. O compromisso com os meninos de rua, certamente não é fácil, pelo contrário, às vezes parece frustrante e sem perspectiva, e em tal caso pode-se ter a tentação de “deixar as armas” e retirar-se. É o momento de recorrer às motivações de fundo que impulsionaram a dedicar-se a esta obra benemérita. Para o fiel trata-se em primeiro lugar de motivações de fé. De todo modo é útil olhar com atenção sobre quem faz uma experiência decididamente positiva, - e isto emergiu claramente durante o Encontro -, para quem sustenta justamente que o trabalho tem resultados satisfatórios para muitos, e, às vezes, para a maioria dos casos. Porém, é necessária a prudência para esperar a confirmação do tempo, verificando-se por exemplo, depois de cinco anos, o “resultado” da recuperação e da normalização do sujeito. De fato, poderia verificar-se uma recaída, um retorno à rua; porém, verifica-se também o contrário para quem, refratário num primeiro momento à obra dos educadores, abre-se mais tarde ao caminho de recuperação dos valores que lhe foram propostos.
12. Todavia foi geral a constatação da urgência de intervenção: o nome da infância é “hoje“, amanhã é demasiado tarde. Além disso, a recuperação em tenra idade é relativamente fácil, e não é o mesmo quando inicia a adolescência.
13. Infelizmente a Convenção da ONU, de 1989, sobre os Direitos da criança, apesar de ser aprovada formalmente por tantos países, é ainda hoje muito desatenta na aplicação.
Recomendações
1. Resulta com evidência que é necessária uma maior tomada de consciência sobre a gravidade do fenômeno e um maior empenho sistemático para enfrentá-lo, e isto vale também para o âmbito eclesial onde as intervenções de caráter humanitário em favor dos meninos de rua deveriam ser acompanhadas com a essencial obrigação de evangelização. Tem sido o desejo de todos a organização de uma pastoral específica para estes meninos, formulando novas estratégias e modalidades para colocá-los em contato com a força libertadora do Evangelho.
2. Todavia, como resulta também da investigação em vista do Encontro, somente uma minoria das iniciativas, incluindo o âmbito eclesial, vai além das intervenções sócio-assistenciais e psico-pedagógicas, as quais não assumem, pelo menos num primeiro momento, uma clara e qualificada pastoral de primeira ou de nova evangelização, na tentativa de recuperar e valorizar a dimensão religiosa do menino.
4. De todo modo o quadro de referência de quem faz “leva” sobre a proposta religiosa, - que permanece fundamental porque o problema que é comum ao povo da rua não é tanto a miséria, a tóxico-dependência, o alcoolismo, a marginalização, a violência, a criminalidade, a Aids, a prostituição, mas sim, o terrível mal da ‘morte da alma’ (“a paga do pecado é a morte”: Rm 6,23); trata-se aqui com muita freqüência de criaturas que, na plena juventude estão ‘mortas por dentro’- é o seguinte:
a) É necessário acolher o urgente convite para uma nova evangelização que o Santo Padre há muitos anos repete. Somente o encontro com o Cristo Ressuscitado pode devolver a alegria da ressurreição a quem está na morte. Somente o encontro com Aquele que veio enfaixar as feridas dos corações despedaçados pode curar as profundas feridas dos corações traumatizados e empedernidos pelas muitas frustrações e violências sofridas.
b) É fundamental passar da pastoral de espera à pastoral do encontro, agindo com fantasia, criatividade e coragem a fim de encontrar os meninos nos seus novos lugares de reunião, nas ruas e nas praças, como também nos lugares freqüentados por eles, isto é, nas discotecas e nas zonas mais ‘quentes’ das nossas metrópoles. É necessário ir ao encontro deles com amor para levar o feliz anúncio e testemunhar com a própria experiência de vida que Cristo é o Caminho, a Verdade e a Vida.
c) É indispensável dar testemunho da luz de Jesus Cristo que ilumina e abre novos caminhos a quem se sente torturado pelas trevas. É pois, urgente despertar na comunidade cristã a própria vocação ao serviço e à missão, num crescente e sentido conhecimento do poder salvífico da fé e dos sacramentos. De fato, muitos meninos continuam morrendo nas ruas diante da indiferença da maioria: não acolher com grande empenho o aflito convite do Santo Padre à nova evangelização é um verdadeiro e próprio pecado de omissão por falta de socorro aos irmãos ‘moribundos’. Por isso é importante contemplar, nos projetos pastorais, as mais variadas intervenções que levem o primeiro anúncio aos ‘que estão longe’, que dêem a possibilidade aos meninos de rua de serem acompanhados, a fim de estabelecer uma nova relação consigo mesmo, com os outros e com Deus, com a comunidade de pertença ou de adoção e de descobrir que existe alguém que os ama.
d) Deseja-se porém:
- A criação de comunidades e grupos (paroquiais ou não) onde os jovens tenham a possibilidade de conhecer e viver o Evangelho com radicalidade, experimentando em primeira pessoa o poder da cura.
- A instituição nas paróquias e nas várias realidades eclesiais, escolas de oração que dêem um novo impulso à dimensão contemplativa e de conseqüência missionária dos diferentes grupos.
- A formação de equipes de evangelização capazes de testemunhar com entusiasmo a maravilhosa Notícia que Cristo veio nos trazer, e meninos ‘missionários’ que levem o abraço de Cristo Ressuscitado aos seus companheiros e aos ‘novos pobres’ do nosso século.
- Além disso, a formação nas várias dioceses de jovens cada vez mais preparados profissionalmente que saibam fazer confluir os seus talentos artísticos e musicais na criação de novos espetáculos capazes de incidir significativamente na prevenção e reunir com mensagens evangélicas milhares de jovens.
- A criação de centros de formação à evangelização de rua, a constituição de lugares alternativos de encontro juvenil que ofereçam propostas densas de valores e significados e de centros de escuta e de iniciativas de prevenções e de evangelização nas escolas.
- O compromisso em utilizar os mass-mídia como preciosos instrumentos para “gritar sobre os tetos” o Evangelho.
- A constituição de novas comunidades e grupos de acolhida que acompanhem os meninos num longo e empenhado caminho de cura interior, baseada no Evangelho, com aquele amor que Cristo nos ensinou, um amor que não se contenta de fazer a caridade, mas sim, que se encarregue do grito, da angústia, das feridas, da morte dos pequenos e dos pobres, um amor pronto a dar a vida para os próprios amigos.
5. Durante o Encontro constatou-se todavia, que, também o educador que não parte da explícita e forte proposta religiosa, pode viver - e é real para muitos - uma atitude interior inspirada na fé, bem expressada - e a desejamos inspiradora para todos - de uma tríplice imagem evangélica.
a) antes de tudo aquela de Jesus diante da adúltera: o Mestre é respeitoso e afetuoso, não julga, não condena a pessoa, mas a encoraja com a sua própria atitude a mudar de vida.
b) A segunda imagem, do Bom Pastor que vai à procura da ovelha perdida (tanto mais se, trata-se de um cordeirinho) encoraja a não esperar, e muito menos pretender, que seja a ovelha a retomar o caminho do aprisco.
Estas, pois, resultaram ser as etapas obrigadas e desejadas para uma pastoral dos meninos de rua:
- observar, escutar, compreender por dentro este mundo que é tão misterioso (o Bom pastor conhece as suas ovelhas);
- tomar a iniciativa do encontro, caminhando pela rua, de tal maneira que o menino perceba que o educador se encontra bem, ali também, onde ele escolheu de estar ou é obrigado a ficar (o Pastor deixa o aprisco e vai);
- formar com ele uma relação espontânea, calorosa de afeto e de interesse, de uma autêntica amizade que não é necessário proclamar com tantas palavras pois, transparece em cada gesto (O Pastor a leva sobre os ombros e faz festa com os amigos).
c) A terceira imagem é aquela dos discípulos de Emaús: eles finalmente abriram os olhos diante do Cristo Ressuscitado e à perspectiva da ressurreição depois de ter feito um certo percurso, durante o qual não foram os olhos, mas o coração que se sentiu impelido para abrir-se à Novidade evangélica.
6. É evidente que com esta atitude interior o segundo percurso educativo sopra enunciado (v. N. 3) tem muito em comum com o primeiro e, sobretudo, os dois têm uma única meta final. Partilham, pois, o objetivo e o método, particularmente nestes traços fundamentais que assim se propõem:
a) Suscitar confiança e auto-estima de tal maneira que o menino compreenda e sinta que ele é importante para o educador, assim como o educador é importante para ele: é o ponto de partida para fazer com convicção e decisão os primeiros passos para outra escolha de vida. Precisa acompanhá-lo na descoberta do Amor de Deus através da experiência concreta do sentir-se acolhido, aceito incondicionalmente e amado pessoalmente por aquilo que ele é. Este contato do tu a tu deve ser continuado também depois que o menino passou sob o cuidado de outros educadores, ou deixou a estrutura de acolhida.
b) Dar espaço ao menino para que tenha um papel ativo na comunidade, suscitar nele o sentido de responsabilidade e de liberdade fazendo com que, na comunidade, sinta-se em sua casa. Isto comporta que na “casa” continue a predominar o calor humano, a espontaneidade, o aproximar-se amigável, mais que a imposição ou a ordem, a disciplina, ou uma norma escrita.
c) Cultivar o relacionamento pessoal com cada menino. De fato, por mais que as metodologias e as regras gerais sejam úteis, cada menino é um caso particular, é um modo original, tem a sua história. Muitos, além disso, mostraram inteligência e energia em sobreviver à situações dificílimas, revelaram-se hábeis, criativos, astutos. Dever-se-á, pois, continuar procurando estes recursos mais ou menos manifestos da sua personalidade a fim de orientá-los a “mudar de caminho” para fazê-los sujeitos e não somente objetos de pastoral para a sua recuperação. Os programas pedagógico-educativos têm portanto, o importante dever de levar o menino a descobrir e valorizar o próprio potencial positivo, fazer frutificar os talentos e desenvolver o melhor possível as suas próprias capacidades.
d) Ter como objetivo (e não é ilusão utópica) que o menino faça próprio e interiorize profundamente o projeto educativo a tal ponto, oxalá, de tornar-se, depois de alguns anos, ajuda e estímulo para outros meninos de rua a fazer o mesmo percurso. Assim ele se coloca ao lado do educador, tornando-se ele mesmo educador, sujeito desta pastoral específica.
e) Reconhecer no empenho a favor dos meninos de rua um caminho privilegiado de serviços ao Senhor e de encontro com Ele: “Toda vez que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40).
7. É evidente dizer que o melhor dos recursos empregados neste campo deve ser orientado para preparar profissionalmente e espiritualmente os Agentes pastorais, que devem mostrar uma grande maturidade humana, serem capazes de renunciar ao sucesso imediato e alimentar a confiança que o fruto do seu empenho poderá revelar-se imediatamente, ou, também, depois de momentos em que parecia que tudo estava para acabar em nada. Além disso, eles devem ter grande capacidade de agirem em sintonia e colaboração com os outros educadores.
8. Prever um trabalho com a família de origem (quando possível), que incida positivamente sobre dinâmicas familiares não sadias e que seja orientado o apoio para a reconstrução da estrutura familiar e ao acompanhamento e re-inserção gradual do menino no núcleo de pertença.