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CELEBRAÇÃO MATUTINA TRANSMITIDA AO VIVO
DA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

HOMILIA DO PAPA FRANCISCO

"Não esqueçamos a gratuidade da revelação"

Sexta-feira, 13 de março de 2020

[Multimídia]


 

Introdução à Santa Missa

Nestes dias unimos-nos aos doentes, às famílias, que sofrem esta pandemia. E gostaria de rezar hoje também pelos pastores que devem acompanhar o povo de Deus nesta crise: que o Senhor lhes dê a força e também a capacidade de escolher os meios melhores para ajudar. Nem sempre as medidas drásticas são boas, por isso rezemos: para que o Espírito Santo dê aos pastores a capacidade e o discernimento pastoral a fim de que providenciem medidas que não deixem sozinho o santo povo fiel de Deus. Que o povo de Deus se sinta acompanhado pelos pastores e pelo conforto da Palavra de Deus, dos sacramentos e da oração.

Homilia

Ambas as leituras são uma profecia da Paixão do Senhor. José vendido como escravo por 20 moedas de prata, entregue aos pagãos. E a parábola de Jesus, que fala clara e simbolicamente do assassinato do Filho. Esta história de “um homem que possuía um terreno, plantou nele uma vinha – o cuidado com o qual a fizera – cercou-a com uma sebe, abriu nela um lugar para a prensa e construiu uma torre – tinha feito isto muito bem. Depois, arrendou-a a vinhateiros e partiu para longe”. Este é o povo de Deus. O Senhor escolheu aquele povo, há a eleição daquele povo. É o povo da eleição. Também há uma promessa: “Ide avante. Vós sois o meu povo”, uma promessa feita a Abraão. E também há uma aliança feita com o povo no Sinai. O povo deve guardar sempre a eleição na memória, que é um povo eleito, a promessa para olhar em frente com esperança e a aliança para viver a fidelidade cada dia.

Mas nesta parábola, acontece que quando chegou o tempo para colher o fruto, esse povo esqueceu-se de que ele não era o proprietário: “Os lavradores pegaram nos servos, bateram num deles, mataram outro, lapidaram o outro. Depois o senhor mandou outros servos, mais numerosos, mas trataram-nos do mesmo modo”. Certamente, Jesus mostra – falando aos doutores da lei – como os doutores da lei trataram os profetas. “Por último, mandou-lhes o próprio filho”, pensando que o respeitariam. “Mas os lavradores, vendo o filho, disseram entre si: ‘Este é o herdeiro. Vamos, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança!”. Roubaram a herança, que era outra. Uma história de infidelidade, de infidelidade à eleição, de infidelidade à promessa, de infidelidade à aliança, que é um dom. A eleição, a promessa e a aliança são um dom de Deus. Infidelidade ao dom de Deus. Não entender que era um dom e tomá-lo como propriedade. Esse povo apropriou-se do dom, tirou esse dom para o transformar em “minha“ propriedade. E o dom, que é riqueza, abertura, bênção, foi encerrado, aprisionado numa doutrina de muitas leis. Foi ideologizado. E assim o dom perdeu a sua natureza de dom, acabou numa ideologia. Sobretudo numa ideologia moralista, repleta de preceitos, inclusive ridícula porque passa para a casuística em tudo. Apropriaram-se do dom.

Este é o grande pecado. É o pecado de esquecer que Deus se fez Ele mesmo dom para nós, que Deus nos ofereceu isto como dom e, esquecendo isto, tornar-nos proprietários. E a promessa já não é promessa, a eleição já não é eleição: “A aliança deve ser interpretada segundo o meu parecer, ideologizado”.

Aí, nessa atitude, talvez eu veja no Evangelho o início do clericalismo, que é uma perversão, que renega sempre a eleição gratuita de Deus, a aliança gratuita de Deus, a promessa de Deus. Esquece a gratuidade da revelação, esquece que Deus se manifestou como dom, se fez dom para nós e nós devemos dá-lo, mostrá-lo aos outros como dom, não como nossa posse. O clericalismo não é uma coisa somente destes dias, a rigidez não é uma coisa destes dias, já havia no tempo de Jesus. E depois Jesus seguirá adiante na explicação das parábolas – esse é o capítulo 21 – seguirá adiante até chegar ao capítulo 23 com a condenação, onde se vê a ira de Deus contra aqueles que tomam o dom para si como propriedade e reduzem a sua riqueza aos caprichos ideológicos da própria mente.

Peçamos ao Senhor a graça de receber o dom como dom e transmiti-lo como dom, não como propriedade, não de modo sectário, rígido, “clericalista”.

 



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