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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO À COLÔMBIA
(6-11 DE SETEMBRO DE 2017)

ENCONTRO COM OS BISPOS DA COLÔMBIA

DISCURSO DO SANTO PADRE

Salão do Palácio Cardinalício (Bogotá)
Quinta-feira, 7 de setembro de 2017

[Multimídia]


 

A paz esteja convosco!

Assim o Ressuscitado saudou o seu pequeno rebanho depois de ter vencido a morte; permiti que vos saúde do mesmo modo, no início da minha viagem.

Agradeço as palavras de boas-vindas. Estou feliz porque os primeiros passos que dou neste país me levam a encontrar-vos, Bispos da Colômbia, e, em vós, abraçar toda a Igreja colombiana e estreitar o vosso povo ao meu coração de Sucessor de Pedro. Agradeço-vos imenso pelo vosso ministério episcopal, pedindo-vos para continuardes a exercê-lo com renovada generosidade. Dirijo uma saudação particular aos Bispos eméritos, encorajando-os a continuarem a apoiar, com a oração e a presença discreta, a Esposa de Cristo à qual generosamente se entregaram.

Venho anunciar Cristo e, em seu nome, realizar um caminho de paz e reconciliação. Cristo é a nossa paz! Reconciliou-nos com Deus e entre nós!

Estou convencido de que a Colômbia possui algo de original, algo muito original, que chama fortemente a atenção: nunca foi uma meta completamente realizada, um destino completamente alcançado, nem um tesouro totalmente possuído. A sua riqueza humana, os seus abundantes recursos naturais, a sua cultura, a sua luminosa síntese cristã, o património da sua fé e a memória dos seus evangelizadores, a alegria espontânea e sem reservas do seu povo, o sorriso impagável da sua juventude, a sua original fidelidade ao Evangelho de Cristo e à sua Igreja e sobretudo a sua coragem indómita de resistir à morte, não só anunciada, mas muitas vezes semeada. E tudo isto se subtrai como a púdica flor da mimosa no jardim – digamos que se esconde – àqueles que se apresentam como forasteiros ávidos de a subjugar, ao passo que se oferece generosamente a quem toca o seu coração com a mansidão do peregrino. A Colômbia é assim.

Por isso, como peregrino, me dirijo à vossa Igreja. Sou vosso irmão, desejoso de partilhar Cristo ressuscitado, para Quem nenhum muro é eterno, nenhum medo é indestrutível, nenhuma chaga – nenhuma chaga – é incurável.

Não sou o primeiro Papa que vos fala aqui na vossa casa. Dois dos meus maiores Predecessores foram hóspedes aqui: o Beato Paulo VI, que veio pouco depois da conclusão do Concílio Vaticano II para encorajar a realização colegial do mistério da Igreja na América Latina; e São João Paulo II, na sua memorável visita apostólica de ‘86. As palavras de ambos constituem um recurso permanente: as indicações que delinearam e a síntese maravilhosa que ofereceram sobre o nosso ministério episcopal constituem um património a preservar. Não estão antiquadas. Aquilo que eu vos disser, gostaria que fosse recebido em continuidade com o que eles ensinaram.

Guardiões e sacramento do primeiro passo

«Dar o primeiro passo» é o lema da minha visita e constitui também a minha primeira mensagem para vós. Bem sabeis que Deus é o Senhor do primeiro passo. Ele sempre nos antecede. Toda a Sagrada Escritura fala de Deus como exiliado de Si mesmo por amor. Foi assim quando só havia trevas, caos e, saindo de Si mesmo, fez com que tudo viesse à existência (cf. Gn 1, 1 – 2, 4); foi assim quando Ele, ao passear no jardim das origens, Se deu conta da nudez da sua criatura (cf. Gn 3, 8-9); foi assim quando Ele, peregrino, parou na tenda de Abraão, deixando-lhe a promessa duma inesperada fecundidade (cf. Gn 18, 1-10); foi assim quando Se apresentou a Moisés fascinando-o, a ele que não tinha outro horizonte além de pastorear as ovelhas do seu sogro (cf. Ex 3, 1-2); foi assim quando não desviou o olhar da sua amada Jerusalém, mesmo se ela se prostituía no caminho da infidelidade (cf. Ez 16, 15); foi assim quando emigrou com a sua glória para o meio do seu povo exilado na escravidão (cf. Ez 10, 18-19).

E, na plenitude do tempo, quis revelar-nos o primeiro passo, o nome do primeiro passo, do seu primeiro passo. Chama-se Jesus e é um passo irreversível. Provém da liberdade de um amor que precede tudo. Porque o Filho, Ele mesmo, é expressão viva desse amor. Aqueles que O reconhecem e acolhem, recebem em herança o dom de ser introduzidos na liberdade de poderem realizar, sempre n’Ele, esse primeiro passo, não têm medo de se perder se saem de si mesmos, porque possuem a garantia do amor que deriva do primeiro passo de Deus, uma bússola que não os deixa perder-se.

Por isso guardai, com santo temor e emoção, aquele primeiro passo de Deus rumo a vós e, pelo vosso ministério, rumo ao povo que vos está confiado, na certeza de vós serdes sacramento vivo daquela liberdade divina que não tem medo de sair de si mesma por amor, que não teme empobrecer quando se dá, que não precisa de outra força além do amor.

Deus precede-nos: somos ramos, não somos a videira. Portanto, não silencieis a voz d’Aquele que vos chamou, nem vos iludais de que sejam a soma das vossas pobres virtudes – as vossas – ou os elogios dos poderosos de turno que asseguram o resultado da missão que Deus vos confiou. Ao contrário, mendigai, mendigai na oração quando não puderdes dar nem dar-vos, para terdes algo a oferecer àqueles que constantemente se aproximam do vosso coração de Pastores. A oração na vida do Bispo é a seiva vital que passa através da videira, sem a qual o ramo murcha tornando-se infrutífero. Por isso, lutai com Deus – e mais ainda na noite da sua ausência – até que Ele vos abençoe (cf. Gn 32, 25-27). As feridas desta batalha diária e prioritária na oração serão fonte de cura para vós; sereis feridos por Deus para vos tornardes capazes de curar.

Tornar visível a vossa identidade de sacramento do primeiro passo de Deus

Na verdade, tornar palpável a identidade de sacramento do primeiro passo de Deus exigirá um êxodo interior contínuo. «De facto não há convite para amar mais eficaz do que ser os primeiros a amar» (Santo Agostinho, De catechizandis rudibus, I, 4.7, 26: PL 40), pelo que nenhum campo da missão episcopal pode prescindir desta liberdade de realizar o primeiro passo. A condição que torna possível o exercício do ministério apostólico é a prontidão em nos aproximarmos de Jesus, deixando para trás «o que fomos, para podermos ser o que não éramos» (Idem, Enarratio in Psalmos, 121, 12: PL 36).

Recomendo-vos que vigieis, individual e colegialmente, dóceis ao Espírito Santo, sobre este ponto de partida permanente. Sem este núcleo, definham os traços do Mestre no rosto dos discípulos, a missão bloqueia-se e diminui a conversão pastoral, que mais não é do que dar resposta à urgência do anúncio do Evangelho da alegria hoje, amanhã e no dia seguinte (cf. Lc 13, 33), solicitude que devorou o coração de Jesus, deixando-O sem ninho nem abrigo, entregue unicamente à realização até ao fim da vontade do Pai (Lc 9, 58.62). Que outro futuro podemos perseguir? A que outra dignidade podemos aspirar?

Não vos meçais com o metro daqueles que quereriam que fósseis apenas uma casta de funcionários submetidos à ditadura do presente. Ao contrário, mantende o olhar sempre fixo na eternidade d’Aquele que vos escolheu, prontos a receber o julgamento decisivo dos seus lábios, que é aquele que vale.

Na complexidade do rosto desta Igreja colombiana, é muito importante preservar a singularidade das suas diferentes e legítimas forças, as sensibilidades pastorais, as peculiaridades regionais, as memórias históricas, as riquezas das peculiares experiências eclesiais. O Pentecostes permite que todos escutem na própria língua. Por isso, procurai com perseverança a comunhão entre vós. Nunca vos canseis de a construir através do diálogo franco e fraterno, condenando como uma peste os projetos escondidos, por favor. Sede solícitos a dar o primeiro passo, de um para o outro. Antecipai-vos na disponibilidade a compreender as razões do outro. Deixai-vos enriquecer com aquilo que o outro vos pode oferecer e construí uma Igreja que ofereça a este país um testemunho eloquente de quanto se pode progredir quando se está disposto a não ficar nas mãos de poucos. O papel das Províncias Eclesiásticas relativamente à própria mensagem evangelizadora é fundamental, porque as vozes que a proclamam são diversas e harmonizadas. Por isso não vos contenteis com um medíocre compromisso mínimo, que deixe os resignados na tranquila quietude da sua impotência, enquanto se domesticam aquelas esperanças que precisariam da coragem de ser fundadas mais na força de Deus do que na própria debilidade.

Reservai uma sensibilidade particular às raízes afro-colombianas do vosso povo, que tão generosamente têm contribuído para desenhar o rosto desta terra.

Tocar a carne do corpo de Cristo

Convido-vos a não ter medo de tocar a carne ferida da vossa história e da história do vosso povo. Fazei-o com humildade, sem a vã pretensão de protagonismo mas com o coração indiviso, livre de comprometimentos ou servilismos. Só Deus é o Senhor e, a nenhuma outra causa, se deve submeter a nossa alma de Pastores.

A Colômbia precisa da vossa visão, própria de Bispos, a fim de a apoiar na coragem do primeiro passo para a paz definitiva, a reconciliação, o repúdio da violência como método, a superação das desigualdades que são a raiz de tantos sofrimentos, a renúncia ao caminho fácil mas sem saída da corrução, a consolidação paciente e perseverante da res publica que requer a superação da miséria e da desigualdade.

Trata-se, supostamente, duma tarefa árdua mas irrenunciável: os caminhos são íngremes e as soluções não são óbvias. Da altura de Deus, que é a cruz do seu Filho, obtereis a força; com a luzinha humilde dos olhos do Ressuscitado, percorrereis o caminho; escutando a voz do Esposo que sussurra ao coração, recebereis os critérios para discernir de novo, em cada incerteza, a justa direção.

Um dos vossos ilustres literatos escreveu, referindo-se a um dos seus personagens míticos: «Não imaginava que fosse mais fácil começar uma guerra do que terminá-la» (Gabriel García Márquez, Cem Anos de Solidão, cap. 9). Todos sabemos que a paz exige dos homens uma coragem moral peculiar. A guerra deriva de quanto há de mais baixo no nosso coração; ao contrário, a paz impele-nos a ser maiores do que nós mesmos. Em seguida, o escritor acrescentava: «Não pensava que seriam precisas tantas palavras para explicar o que se sentia na guerra; na realidade, bastava uma só: medo» (Ibid., cap. 15). Não é necessário que vos fale deste medo, raiz envenenada, fruto amargo e herança nefasta de todo o conflito. Desejo encorajar-vos a continuar a acreditar que se pode agir doutra maneira, lembrando que não recebestes um espírito de escravos para recair no temor; o próprio Espírito atesta que sois filhos destinados à liberdade da glória que lhes está reservada (cf. Rm 8, 15-16).

Com os vossos próprios olhos, vedes e conheceis, como poucos, a deformação do rosto deste país; sois guardiões dos elementos fundamentais que o tornam uno, apesar das suas lacerações. Por isso mesmo, a Colômbia precisa de vós para se reconhecer no seu verdadeiro rosto cheio de esperança não obstante as suas imperfeições, para se perdoarem uns aos outros não obstante as feridas ainda não totalmente cicatrizadas, para acreditar que se pode percorrer outro caminho mesmo quando a inércia impele a repetir os mesmos erros, para ter a coragem de superar tudo aquilo que a pode fazer miserável não obstante os seus tesouros.

Confesso-vos que o sinto como um dever; vem-me espontâneo encorajar-vos. Por isso, tenho que dizer-vos: Animai-vos! Sinto este dever: expressar-vos a ânsia que provo de vos dar ânimo. Encorajo-vos, pois, a que não vos canseis de fazer de cada uma das vossas Igrejas um ventre de luz, capaz de gerar, mesmo sofrendo a pobreza, as novas criaturas de que esta terra necessita. Refugiai-vos na humildade do vosso povo para vos dardes conta dos seus secretos recursos humanos e de fé, escutai quanto a sua espoliada humanidade brama pela dignidade que só o Ressuscitado pode conferir. Não tenhais medo de emigrar das vossas aparentes certezas à procura da verdadeira glória de Deus, que é o homem vivo. Coragem! Animo-vos neste caminho.

A palavra da reconciliação

Muitos podem dar a sua contribuição para os desafios desta nação, mas a vossa missão é peculiar. Não sois técnicos nem políticos; sois Pastores. Cristo é a palavra de reconciliação escrita nos vossos corações e tendes a força para a poder pronunciar nos púlpitos, nos documentos eclesiais ou nos artigos dos periódicos, e mais ainda no coração das pessoas, no santuário secreto das suas consciências, na ardente esperança que os atrai quando escutam a voz do céu que proclama: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do seu agrado» (Lc 2, 14). Deveis pronunciá-la com o recurso frágil, humilde mas invencível da misericórdia de Deus, a única capaz de abater o orgulho cínico dos corações autorreferenciais.

À Igreja, a única coisa que lhe interessa é a liberdade de pronunciar esta Palavra. Ser livre, para pronunciar esta Palavra. Não servem alianças com uma parte ou com a outra, mas a liberdade de falar ao coração de todos. É precisamente aqui que tendes a autonomia e o voo para desinquietar, a possibilidade de sustentar uma inversão de rota.

O coração humano, muitas vezes iludido, concebe o projeto insensato de fazer da vida um aumento contínuo de espaços para depositar o que acumula. É uma ilusão. É precisamente aqui que é necessário que ressoe a pergunta: Que aproveita ganhar o mundo inteiro, se fica o vazio na alma (cf. Mt 16, 26)?

Pelos vossos lábios de legítimos Pastores, que sois, a Colômbia tem o direito de ser interpelada pela verdade de Deus, que repete continuamente: «Onde está o teu irmão?» (Gn 4, 9). É um interrogativo que não pode ser silenciado, mesmo quando o ouvinte nada mais pode fazer que baixar o olhar, confundido, e balbuciar a sua própria vergonha por tê-lo vendido, quem sabe, pelo preço dalguma dose de estupefaciente ou por alguma equívoca conceção de Estado, talvez pela consciência errada de que o fim justifica os meios.

Peço-vos para manterdes o olhar sempre fixo no homem concreto. Não sirvais um conceito de homem, mas a pessoa humana amada por Deus, feita de carne e osso, história, fé, esperança, sentimentos, deceções, frustrações, dores, feridas, e vereis que esta visão concreta do homem desmascara as estatísticas frias, os cálculos manipulados, as estratégias cegas, as informações falseadas, lembrando-vos de que, «na realidade, o mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente» (Gaudium et spes, 22).

Uma Igreja em missão

Tendo em conta o generoso trabalho pastoral que já realizais, deixai que vos apresente alguns anseios que trago no meu coração de Pastor, movido pelo desejo de vos exortar a ser cada vez mais uma Igreja em missão. Os meus Predecessores já insistiram sobre alguns destes desafios: a família, a vida, os jovens, os sacerdotes, as vocações, os fiéis-leigos, a formação. Os decénios transcorridos, apesar do enorme trabalho realizado, talvez tenham tornado ainda mais fadigosas as respostas para tornar a maternidade da Igreja eficaz na geração, nutrição e acompanhamento dos seus filhos.

Penso nas famílias colombianas, na defesa da vida desde o ventre materno até ao seu termo natural, na praga da violência e do alcoolismo difusa tantas vezes nas famílias, na fragilidade do vínculo matrimonial e na ausência do pai de família com as suas trágicas consequências de insegurança e orfandade. Penso em tantos jovens ameaçados pelo vazio da alma e arrastados pela evasão da droga, pelo estilo de vida fácil ou pela tentação subversiva. Penso nos numerosos e generosos sacerdotes e no desafio de os apoiar na opção fiel e diária por Cristo e pela Igreja, enquanto alguns outros continuam a viver a cómoda neutralidade de quem não opta por nada para ficar na solidão de si mesmo. Penso nos fiéis-leigos espalhados por todas as Igrejas particulares, perseverando fadigosamente para se deixar congregar por Deus, que é comunhão, mesmo quando não poucos proclamam o novo dogma do egoísmo e da morte de toda a solidariedade (palavra esta, que querem cancelar do dicionário). Penso no esforço imenso de todos por aprofundar a fé e torná-la luz viva para os corações e lâmpadas para dar o primeiro passo.

Não vos trago receitas nem quero deixar-vos uma lista de tarefas. No fundo, gostaria de vos pedir que, realizando em comunhão a vossa gravosa missão de Pastores na Colômbia, conserveis a serenidade. Não sei se vo-lo deveria dizer (isto vem-me agora à mente), mas, se estiver a exagerar, perdoai-me. Ao falar que uma das virtudes que mais precisam é conservar a serenidade, não quero dizer que não a tenham, mas que o momento presente vo-la exige mais. Bem sabeis que, de noite, o maligno continua a semear o joio, mas tende a paciência do Senhor do campo, confiando na boa qualidade das vossas sementes. Aprendei com a sua longanimidade e magnanimidade. Os seus tempos são longos, porque é incomensurável o seu olhar de amor. Quando o amor é reduzido, o coração torna-se impaciente, turbado pela ânsia de fazer coisas, devorado pelo medo de ter falido. Sobretudo acreditai na humildade da semente de Deus. Confiai na força oculta do seu fermento. Orientai o coração para aquele fascínio estupendo que atrai e leva a vender tudo para se possuir este tesouro divino.

De facto, que podeis oferecer de mais forte à família colombiana do que a força humilde do Evangelho do amor generoso que une o homem e a mulher, constituindo-os imagem da união de Cristo e a sua Igreja, transmissores e guardiões da vida? As famílias precisam de saber que, em Cristo, podem tornar-se árvores frondosas capazes de oferecer sombra, dar fruto em todas as estações do ano, abrigar a vida entre os seus ramos. Hoje há muitos que prestam homenagem a árvores sem sombra, infecundas, ramos desprovidos de ninhos. Quanto a vós, o ponto de partida seja o testemunho alegre de que a felicidade está noutro lugar.

Que podeis oferecer aos vossos jovens? Eles querem sentir-se amados, desconfiam de quem os desvaloriza, pedem coerência clara e esperam que os empenhem. Acolhei-os, pois, com o coração de Cristo e abri-lhes espaço na vida das vossas Igrejas. Não participeis em qualquer conluio que lese as suas esperanças. Não tenhais medo de levantar serenamente a voz, para lembrar a todos que uma sociedade, que se deixe seduzir pela miragem do narcotráfico, arrasta aquela metástase moral que mercantiliza o inferno e semeia a corrução por toda a parte e, ao mesmo tempo, engorda os paraísos fiscais.

Que podereis dar aos vossos sacerdotes? O primeiro dom é o da paternidade, garantindo-lhes que a mão que os gerou e ungiu não se retirou da sua vida. É verdade que vivemos na era da informática e não vos será difícil alcançar os vossos sacerdotes em tempo real, através de algum programa para envio de mensagens. Mas o coração dum pai, dum Bispo, não se pode limitar a uma comunicação precária, impessoal e externa com o seu presbitério. Não pode desaparecer do coração do Bispo a preocupação, a sã preocupação pela vida que levam os seus sacerdotes. Vivem verdadeiramente segundo Jesus? Ou improvisaram outras seguranças, como a estabilidade económica, a ambiguidade moral, a vida dupla ou a aspiração míope por uma carreira? Os sacerdotes carecem, com vital e urgente necessidade, da proximidade física e afetiva do seu Bispo. Os sacerdotes precisam de sentir que têm um pai.

Sobre as costas dos sacerdotes, pesa frequentemente a fadiga do trabalho diário da Igreja. Encontram-se na vanguarda, continuamente circundados de pessoas que, abatidas, procuram neles o rosto do Pastor. As pessoas aproximam-se e batem à porta do seu coração. Eles devem dar de comer às multidões, e o alimento de Deus não é jamais uma propriedade da qual se possa dispor incondicionalmente. Pelo contrário, provém apenas da indigência posta em contacto com a bondade divina. Despedir a multidão e alimentar-se com o pouco que cada um possa indevidamente apropriar-se é uma tentação permanente (cf. Lc 9, 12-13).

Por isso, vigiai sobre as raízes espirituais dos vossos sacerdotes. Conduzi-los continuamente até àquela Cesareia de Filipe, onde possam, desde as origens do Jordão de cada um, escutar de novo a pergunta de Jesus: «Para ti, Quem sou Eu?» E a razão do gradual deterioramento, que muitas vezes leva à morte do discípulo, está sempre num coração que já não pode responder: «Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo» (cf. Mt 16, 13-16). A partir disso, esmorece a coragem da irreversibilidade do dom de si mesmo e deriva também a desorientação interior, o cansaço dum coração que já não sabe acompanhar o Senhor no seu caminho para Jerusalém.

De modo especial cuidai, por favor, do itinerário de formação dos vossos sacerdotes, desde o nascimento da chamada de Deus nos seus corações. A nova Ratio Fundamentalis Institutionis Sacerdotalis, recentemente publicada, constitui um recurso valioso, à espera de aplicação, para que a Igreja na Colômbia esteja à altura do dom de Deus que nunca cessou de chamar muitos dos seus filhos ao sacerdócio.

Não transcureis, por favor, a vida dos consagrados e consagradas. Constituem o safanão querigmático a todo o mundanismo, sendo chamados a queimar qualquer refluxo de valores mundanos no fogo das Bem-aventuranças vividas sine glosa e no total abaixamento de si mesmos no serviço. Por favor, não os considereis como «recursos úteis» para as obras apostólicas; antes, sabei reconhecer neles o grito do amor consagrado da Esposa: «Vem, Senhor Jesus!» (Ap 22, 20).

A mesma preocupação formadora deve ser reservada aos fiéis-leigos, de quem depende não só a solidez das comunidades de fé, mas também grande parte da presença da Igreja nos campos da cultura, da política, da economia. Formar na Igreja significa pôr-se em contacto com a fé ardente da comunidade viva, penetrar num património de experiências e respostas suscitadas pelo Espírito Santo, porque é Ele que ensina todas as coisas (cf. Jo 14, 26).

E, antes de terminar (já me alonguei um pouco!), gostaria de dedicar um pensamento aos desafios da Igreja na Amazónia, uma região da qual justamente vos sentis orgulhosos, porque é parte essencial da maravilhosa biodiversidade deste país. A Amazónia constitui, para todos nós, um teste decisivo para verificar se a nossa sociedade, quase sempre confinada no materialismo e no pragmatismo, está em condições de salvaguardar o que recebeu gratuitamente, não para o espoliar, mas para o fazer frutificar. Penso sobretudo na arcana sabedoria dos povos indígenas da Amazónia, interrogando-me se ainda somos capazes de aprender deles a sacralidade da vida, o respeito pela natureza, a consciência de que a razão instrumental não é suficiente para colmar a vida do homem e dar resposta aos seus interrogativos mais inquietantes.

Por isso, convido-vos a não abandonar a si mesma a Igreja na Amazónia. A consolidação dum rosto amazónico para a Igreja que peregrina aqui é um desafio para todos vós, que depende do crescente e consciencioso apoio missionário de todas as dioceses colombianas e de todo o seu clero. Ouvi dizer que, nalgumas línguas nativas da Amazónia, para referir a palavra «amigo», usa-se a expressão «o outro meu braço». Sede, pois, o outro braço da Amazónia. A Colômbia não a pode amputar, sem ficar mutilada no seu rosto e na sua alma.

Queridos irmãos!

Convido-vos agora a voltarmo-nos espiritualmente para Nossa Senhora do Rosário de Chiquinquirá, cuja imagem tivestes a delicadeza de trazer do seu Santuário até à magnífica Catedral desta cidade para que também eu a pudesse contemplar.

Como bem sabeis, a Colômbia não pode conseguir por si mesma a verdadeira Renovação por que aspira, mas é-lhe concedida do Alto. Então supliquemo-la ao Senhor, por intermédio da Virgem Nossa Senhora.

Da mesma forma que, em Chiquinquirá, Deus renovou o esplendor do rosto da sua Mãe, assim continue a iluminar, com a sua luz celeste, o rosto deste país inteiro e abençoe a Igreja na Colômbia com a sua benévola companhia e vos abençoe a vós, a quem agradeço tudo o que fazeis. Obrigado!

 



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