CARTA APOSTÓLICA
DUODECIMUM SAECULUM
DO SUMO PONTÍFICE JOÃO PAULO II
AO EPISCOPADO DA IGREJA CATÓLICA
SOBRE A VENERAÇÃO DAS IMAGENS
POR OCASIÃO DO XII CENTENÁRIO DO
II CONCÍLIO DE NICÉIA
Veneráveis Irmãos, saúde e Bênção Apostólica!
1. O décimo segundo centenário do II Concilio de Nicéia (a. 787) foi objeto de numerosas comemorações eclesiais e acadêmicas, as quais também esta Sé Apostólica se associou (1). O acontecimento foi celebrado igualmente com a publicação de uma Encíclica de Sua Santidade o Patriarca de Constantinopla e do Santo Sínodo (2), iniciativa que evidencia a importância teológica e o alcance ecumênico, ainda atuais, do sétimo e último Concílio plenamente reconhecido pela Igreja católica e pela Igreja ortodoxa. A doutrina definida por este Concílio quanto a legitimidade da veneração dos ícones (imagens) na Igreja merece também ela uma atenção especial, não só pela riqueza das suas implicações espirituais, mas também pelas exigências que ela impõe em todo o âmbito da arte sacra.
O relevo dado pelo II Concílio de Nicéia ao assunto da Tradição, e mais precisamente da tradição não-escrita, constitui para nós católicos, assim como para os nossos irmãos ortodoxos, um convite a percorrermos de novo juntos o caminho da Tradição da Igreja não dividida, para reexaminar à sua luz as divergências, que os longos séculos de separação acentuaram entre nós, e para reencontrar; conforme o que Jesus pediu ao Pai (cf. Jo 17,11.20-21), a comunhão plena na unidade visível.
2. O Patriarca de Constantinopla São Tarásio, moderador do II Concílio Niceno, ao apresentar ao Papa Adriano I o relatório do desenrolar do Concílio, escrevia: "Depois de termos todos ocupado o próprio lugar, nós estabelecemos ter Cristo como (nosso) chefe. Com efeito, o Santo Evangelho foi colocado em cima dum trono, como convite a todos os presentes a julgarem segundo a justiça" (3).O fato de se ter constituído Cristo como presidente da assembléia conciliar, que se reunia no seu nome e sob a sua autoridade, foi um gesto eloquente para afirmar que a unidade da Igreja não pode realizar-se a não ser na obediência ao seu único Senhor.
3. Os imperadores que tinham convocado o Concílio, Irene e Constantino VI, tinham convidado o meu Predecessor Adriano I, "enquanto verdadeiro primeiro Pontífice, que preside no lugar e na sede do santo e muito venerável Apóstolo Pedro" (4). Ele fez-se representar pelo Arcebispo da Igreja romana e pelo Hegúmeno (Abade) do mosteiro grego de São Sabas em Roma. Para assegurar a representatividade universal da Igreja, era requerida também a presença dos Patriarcas orientais (5). Uma vez que os seus territórios se encontravam já sob o domínio muçulmano, os Patriarcas de Alexandria e de Antioquia enviaram conjuntamente uma carta comum a São Tarásio; e o Patriarca de Jerusalém enviou uma carta sinodal. Uma e outra foram lidas no Concílio (6).
Admitia-se então comumente que as decisões de um Concílio ecumênico eram válidas somente se o Bispo de Roma nelas tivesse colaborado e se os Patriarcas orientais tivessem manifestado o seu acordo (7). Neste processo o papel da Igreja de Roma era reconhecido como insubstituível (8). Assim o II Concílio Niceno aprovou a explicação do Diácono João, segundo a qual a assembléia dos iconoclastas, realizada em Hiéria em 754, não era legítima, porque "o Papa de Roma e os Bispos que estão à sua volta não tinham colaborado nela, nem através de legados, nem mediante uma carta encíclica, segundo a lei dos Concílios"; e "os Patriarcas do Oriente... e os Bispos que estão com eles não lhe tinham dado o seu consenso" (9). Por outro lado os Padres do II Concílio Niceno declararam que "acolhiam, acatavam e seguiam" a Carta enviada pelo Papa Adriano aos imperadores (10) assim como a dirigida ao Patriarca. Estas Cartas foram lidas, em latim e na sua tradução grega, e todos foram convidados a dar-lhes individualmente o próprio assenso (11).
4. O Concílio saudou unanimemente nas pessoas dos legados pontifícios "a santíssíma Igreja de Roma, ou seja, do Apóstolo São Pedro" (12) e da "Cátedra apostólica" (13), adotando a fórmula romana (14); e o Patriarca Tarásio, escrevendo ao meu predessor em nome do Concílio, reconhecia nele aquele que "herdou a Cátedra do Apóstolo São Pedro", e que, "revestido do Sumo Pontificado, tem a subida honra de presidir, legitimamente e por vontade de Deus, à sagrada Hierarquia" (15).
Um dos momentos decisivos no decorrer do Concílio parece ter sido aquele em que ele se pronunciou a favor do restabelecimento do culto das imagens, quando os participantes acolheram, em unanimidade, a proposta dos legados romanos de fazer colocar no meio da assembléia um venerável ícone, para que os Padres pudessem prestar-lhes a sua veneração (16).
O último Concílio ecumênico reconhecido quer pela Igreja católica quer pela Igreja ortodoxa é um exemplo notável de "sinergia" entre a sede de Roma e uma assembléia conciliar. Ele inscreve-se na perspectiva da eclesiologia patrística de comuhão, fundamentada na Tradição, como o Concílio Ecumênico Vaticano II, justamente, uma vez mais pôs em evidência
5. O Concílio Niceno II afirmou solenemente a existência da "tradição eclesiástica escrita e não-escrita" (17), como referência normativa para a fé e para a disciplina da Igreja. Os Padres manifestaram o seu desejo de "conservar intactas todas as tradições da Igreja, que lhes foram confiadas, sejam elas escritas ou não-escritas. Uma delas consiste precisamente na pintura dos icones, em conformidade com a carta da pregação apostólica" (18). Contra a corrente iconoclasta, que também tinha apelado para a Escritura e para a Tradição dos Padres, especialmente para o pseudo-sínodo de Hiéria de 754, o II Concílio de Nicéía sanciona a legitimidade da veneração das imagens, confirmando "o ensino divinamente inspirado dos santos Padres e da Tradição da Igreja católica" (19).
Os Padres do II Concílio Niceno entendiam a "tradição eclesiástica" como tradição dos seis Concílios ecumênicos precedentes e dos Padres ortodoxos, cujo ensino era acolhido comumente na Igreja. O Concílio, deste modo, definiu como sendo de fé aquela verdade essencial, segundo a qual a mensagem cristã é "tradição", paràdosis. A medida que a Igreja se foi desenvolvendo, no tempo e no espaço, a sua inteligência da Tradição, da qual é portadora, conheceu também ela as fases de um desenvolvimento, cuja investigação constitui, para o diálogo ecumênico e para toda a reflexão teológica autêntica, um percurso obrigatório.
6. Já São Paulo nos ensina que, para a primeira geração cristã, a paràdosis consiste na proclamação do Acontecimento de Cristo e do seu significado atual, que realiza a Salvação mediante a ação do Espírito Santo (cf. 1Cor 15,3-8; 11,2). A tradição das palavras e dos atos do Senhor foi recolhida nos quatro Evangelhos, mas sem se exaurir neles (cf. Lc 1,1; Jo 20,30; 21,25). Esta tradição primigênia é tradição "apostólica" (cf. 2Ts 2,14-15; Jd 17; 2Pd 3,2). Ela diz respeito não apenas ao "depósito" da "sã doutrina" (cf. 2Tm 1,6-12; Tt 1,9), mas também às normas de comportamento e às regras da vida comunitária (cf. lTs 4,1-7; 1Cor 4,17; 7,17; 11,16; 14,33). A Igreja lê a Escritura à luz da "regra da fé" (20), quer dizer, da sua fé viva mantida coerente com o ensino dos Apóstolos. Aquilo que a Igreja sempre acreditou e praticou, ela considera-o justamente como "Tradição apostólica". Santo Agostinho dizia: "Uma observância mantida pela Igreja inteira e conservada sempre, que não tenha sido instituída pelos Concílios, acaba por não ser outra coisa, com pleno direito, senão uma tradição que emana da autoridade dos Apóstolos" (21).
De fato, as tomadas de posição dos Padres no decorrer dos grandes debates teológicos dos séculos IV e V, a importância crescente da instituição sinodal a nível regional e universal, fizeram com que, pouco a pouco, a tradição se tornasse a "tradição dos Padres" ou "tradição eclesiástica", entendida como desenvolvimento homogêneo da Tradição apostólica. Foi por isto que São Basílio Magno fez apelo às "tradições não-escritas", que são as "tradições dos Padres" (22), para fundamentar a sua teologia trinitária, e sublinha a proveniência dupla da doutrina da Igreja "do ensino escrito, bem como da tradição apostólica" (23).
O próprio Concilio Niceno II, que cita oportunamente São Basílio a propósito da teologia das imagens (24), invocou também a autoridade dos grandes doutores ortodoxos, como São Gregório Nazianzeno, São Gregório de Nissa, São Cirilo de Alexandria. São João Damasceno pôs também ele em relevo a importância para a fé das "tradições não escritas", isto é, não contidas na Escritura, ao declarar: "Se alguém se apresentar com um Evangelho diferente daquele que a Igreja católica recebeu dos Santos Apóstolos, dos Padres e dos Concílios e que ela conservou até aos nossos dias, não o escuteis" (25).
7. Mais próximo de nós, o Concílio Vaticano II apresentou novamente em plena luz a importância da "tradição que provém dos Apóstolos". De fato, "a Sagrada Escritura é a Palavra de Deus, enquanto consignada por escrito sob a inspiração do Espírito divino; a Sagrada Tradição, por seu lado, é portadora da Palavra de Deus, confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos, e transmite-a integralmente aos seus sucessores" (26).
"Ora, aquilo que foi transmitido pelos Apóstolos compreende tudo quanto contribui para que o Povo de Deus viva santamente e para o aumento da sua fé" (27). Juntamente com a Sagrada Escritura, a Sagrada Tradição constitui "um único depósito sagrado da Palavra de Deus, confiado à Igreja". A interpretação autêntica "da Palavra de Deus escrita ou contida na Tradição foi confiada unicamente ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade é exercida em nome de Jesus Cristo" (28). É mediante uma fidelidade igual ao tesouro comum da Tradição que remonta aos Apóstolos, que as Igrejas se esforçam hoje por aprofundar os motivos das suas divergências e as razões que há para as superar.
8. A terrível "controvérsia sobre as imagens", que dilacerou o império bizantino sob os imperadores isáuricos Leão III e Constantino V, entre os anos de 730 e 780, e de novo sob Leão V, de 814 a 843, explica-se principalmente pelo debate teológico que, desde o início, foi o seu fulcro.
Sem ignorar o perigo de um ressurgimento sempre possível das praticas idolátricas do paganismo, a Igreja admitia que o Senhor, a Bem-aventurada Virgem Maria, os Mártires e os Santos fossem representados em formas pictóricas ou plásticas para favorecer a oração e a devoção dos fiéis. Era claro para todos, segundo a fórmula de São Basílio, recordada pelo Concílio Niceno II, que "a honra prestada ao ícone é dirigida ao protótipo" (29). No Ocidente, o Papa São Gregório Magno tinha insistido no caráter didático das pinturas nas igrejas, úteis para que os analfabetos, "ao contemplá-las, possam ler, pelo menos nas paredes, aquilo que não são capazes de ler nos livros", e acentuava que esta contemplação devia levar à adoração da "única e onipotente Trindade Santíssima" (30). Foi neste contexto que se desenvolveu, de maneira particular em Roma durante o século VIII, o culto das imagens dos Santos, dando lugar a uma produção artística admirável.
O movimento iconoclasta, rompendo com a tradição autêntica da Igreja, considerava a veneração das imagens como um retorno à idolatria. Não sem contradição e ambiguidade, ele proibia a representação de Cristo e as imagens religiosas em geral, enquanto continuava a admitir as imagens profanas, em particular as imagens do imperador, com os sinais de reverência que a elas andavam ligados. A base da argumentação dos iconoclastas era de natureza cristológica. Como pintar Cristo que unia na sua Pessoa, sem as confundir nem as separar, a natureza divina e a natureza humana? Por outro lado, seria impossível representar a sua divindade inapreensível; por outro, representá-l'O na sua humanidade somente seria dívidi-l'O separando n'Ele a divindade da humanidade. Escolher uma ou outra destas duas vias levaria às duas heresias cristológicas opostas do monofisismo e do nestorianismo. Com efeito, quem pretendesse representar Cristo na sua divindade condenar-se-ia a absorver nessa representação a sua humanidade; e quem mostrasse apenas um retrato de homem, acabaria por ocultar que ele é também Deus.
9. O dilema posto pelos iconoclastas envolvia algo que ia muito além da questão da possibilidade de uma arte cristã; punha em causa toda a visão cristã da realidade da Encarnação e, portanto, das relações de Deus com o mundo, e da graça com a natureza, numa palavra, a especificidade da "Nova Aliança", que Deus concluiu com os homens em Jesus Cristo. Os defensores das imagens advertiram muito bem isso: segundo uma expressão do Patriarca de Constantinopla São Germano, ilustre vítima da heresia iconoclasta, era toda "a economia divina segundo a carne" (31) que era posta de novo em questão.
Com efeito, ver representado o rosto humano do Filho de Deus, "imagem de Deus invisível" (Cl 1,15), é ver o Verbo feito carne (cf. Jo 1,14), o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (cf. Jo 1,29). Portanto, a arte pode representar a forma, a efígie do rosto humano de Deus e levar aquele que o contempla ao mistério inefável do mesmo Deus feito homem para a nossa salvação. Assim, o Papa Adriano pôde escrever: "Graças a um rosto visível, o nosso espírito será transportado, por um atrativo espiritual, até à majestade invisível da divindade, através da contemplação da imagem em que está representada a carne, que o Filho de Deus se dignou assumir para a nossa salvação. E, sendo assim, nós adoramos e conjuntamente louvamos, glorifificando-o em espírito, este mesmo Redentor, porque, como está escrito, 'Deus éEspírito' e é por isso que nós adoramos espiritualmente a sua divindade" (32).
O Concílio Niceno II, portanto, reafirmou solenemente a distinção tradicional entre "a verdadeira adoração (latria)" que, "segundo a nossa fé, é devida somente à natureza divina" e "a prosternação de honra" (timetiké proskynesis), que é prestada aos icones, porque "aquele que se prostra diante do icone, prostra-se diante da pessoa (a hipóstase) daquele que na figuração é representado" (33).
A iconografia de Cristo implica, portanto, toda a fé na realidade da Encarnação e no seu significado inexaurível para a Igreja e para o mundo. Se a Igreja costuma pô-la em prática, fá-lo porque está convencida que o Deus revelado em Jesus Cristo resgatou realmente e santificou a carne e o inteiro mundo sensível, ou seja, o homem com os seus cinco sentidos, a fim de lhe permitir renovar-se constantemente ''a imagem d'Aquele que o criou" (Cl 3,10).
10. O Concílio Niceno II, por conseguinte, sancionou a tradição segundo a qual "devem expor-se as venerandas imagens sacras, manufaturadas com tintas, com mosaico e com outras matérias idôneas, nas igrejas consagradas a Deus, nos vasos e paramentos sagrados, nas paredes e nos retábulos, nas casas e nas ruas; e isto aplica-se tanto à imagem de Nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo e à de Nossa Senhora Imaculada, a santa Theotokos, como às imagens dos veneráveis anjos e de todos os homens santos e piedosos" (34). A doutrina deste Concilio sustentou a arte da Igreja, tanto no Oriente como no Ocidente, inspirando-lhe obras de uma beleza e de uma profundidade sublimes.
Em particular, a Igreja grega e as Igrejas eslavas, apoiando-se nas obras dos grandes teólogos São Nicéforo de Constantinopla e São Teodoro Studita, apologistas do culto das imagens, consideraram a veneração do ícone como parte integrante da Liturgia, à semelhança da celebração da Palavra. Como a leitura dos livros materiais permite a audição da Palavra viva do Senhor, assim a exposição de um ícone figurativo permite àqueles que o contemplam ter acesso aos mistérios da Salvação mediante a vista. "Aquilo que por um lado é manifestado pela tinta e pelo papel, por outro, no ícone, é manifestado pelas várias cores e pelos outros materiais" (35).
No Ocidente, a Igreja de Roma destinguiu-se, numa continuidade sem interrupção, pela sua ação a favor das imagens (36), sobretudo no momento crítico em que, entre os anos de 825 e 843, os impérios bizantino e franco se demonstraram ambos hostis ao Concílio Niceno II. No Concílio de Trento, a Igreja católica reafirmou a doutrina tradicional, contra uma nova forma de iconoclastia que então se manifestava. Mais recentemente, o Concílio Vaticano II recordou com sobriedade a posição constante da Igreja a respeito das imagens (37) e da arte sacra em geral (38).
11. Desde há alguns decênios para cá nota-se um surto de interesse pela teologia e pela espiritualidade dos ícones orientais; isso é sinal de ritual da arte autenticamente cristã. A este propósito, não posso deixer de exortar os meus Irmãos no Episcopado a "manterem o uso de expor imagens nas Igrejas à veneração dos fiéis" (39) e a empenharem-se para que surjam cada vez mais obras de qualidade verdadeiramente eclesial. O crente de hoje, como o de ontem, há de ser ajudado na oração e na vida espiritual mediante a visão de obras que procurem exprimir o mistério sem nunca o ocultar. É esta a razão pela qual, hoje como no passsado, a fé é a indispensável inspiradora da arte da Igreja.
A arte pela arte, que não leve a pensar senão no seu autor, sem estabelecer uma relação com o mundo divino, não encontra espaço na concepção cristã do ícone. Seja qual for o estilo que adote, todo o tipo de arte sacra deve exprimir a fé e a esperança da Igreja. A tradição das imagens mostra que o artista deve ter consciência de cumprir uma missão a serviço da Igreja.
A arte cristã autêntica é aquela que, através da percepção sensível, leva à intuição de que o Senhor está presente na sua Igreja, que os acontecimentos da história da Salvação dão sentido e orientação à nossa vida e que a glória que nos está prometida começa já a transformar a nossa existência. A arte sacra deve tender a proporcionar-nos uma síntese visual de todas as dimensões da nossa fé. A arte da Igreja deve ter a preocupação de falar a linguagem da Encarnação e exprimir, com os elementos da matéria, Aquele que "se dignou habitar na matéria e realizar a nossa salvação através da matéria", segundo a fórmula feliz de São João Damasceno (40).
A redescoberta do ícone cristão ajudará também a tomar consciência da urgência de reagir contra os efeitos despersonalizadores, e às vezes degradantes, das múltiplas imagens que condicionam a nossa vida, na publicidade e nos "mass-media"; trata-se de fato de uma imagem que faz chegar até nós o olhar de um Outro invisível e que nos dá acesso à realidade do mundo espiritual e escatológico.
12. Amadíssimos Irmãos: Ao recordar a atualidade da doutrina do VII Concílio Ecumênico, parece-me que estamos perante um chamamento à nossa tarefa primordial de evangelização. A secularização crescente da sociedade mostra que ela está se tornando, em larga escala, alheia aos valores espirituais, ao mistério da nossa Salvação em Jesus Cristo e à realidade do mundo futuro. A nossa tradição mais autêntica, que compartilhamos plenamente com os nossos irmãos ortodoxos, ensina-nos que a linguagem da beleza, posta a serviço da fé, é capaz de atingir o coração dos homens e de os levar a conhecer, a partir de dentro, Aquele que ousamos representar nas imagens, Jesus Cristo, o Filho de Deus feito homem, o mesmo, ontem e hoje e por todos os séculos" (Hb 13,8).
A todos dou, de coração, a Bênção Apostólica.
Dado em Roma, junto de São Pedro, a 4 de dezembro, memória litúrgica de São João Damasceno, Presbítero e Doutor da Igreja, do ano de 1987, décimo do meu Pontificado.
Referências
1. Especialmente com a Carta de 8 de outubro de 1987, do Cardeal Secretário de Estado ao Presidente da Sociedade Internacional para a História dos Concílios, por ocasião do Simpósio de Istambul (L'Osservatore Romano, ed. quot. 12/13.10.87).
2. Epi te 1200 è epetèio apo tes syncleoseos tes en Nikai Aghias z'Oikomenikes Synodoy (787-1987), Fanar, 14 de setembro de 1987.
3. J. D. Mansi, Sacrorum Conciliorum nova et amplissima colectio (= Mansi) XIII, 459c.
4. Mansi XII, 985.
5. Cf. Mansi XII, 1007.1086 e Monumenta Germaniae Historica (= MGH), (Epistulae Karolini Aevi, t. 3), p. 29. 30-33.
6. Cf. Mansi XII, 1127-1135 e 1135-1145.
7. Segundo o Presbítero João, representante dos Patriarcas orientais, Mansi XII, 990A e XIII, 4A.
8. Cf. Mansi XII, 1134.
9. Mansi XIII, 208-209.
10. Mansi XI, 1085.
11. Cf. Mansi XII, 1085-1111.
12. Maisi XII, 994.1041.1114; XIII, 157.204.366.
13. Mansi XII, 1086.
14. Cf. carta de Adriano I a Carlos Magno, em: MGH, Epistulae III (Epistulae Merowingici et Karolini Aevi, t. I) p.
587, 5.
15. Mansi XIII, 463BC.
16. Cf. Mansi XIII, 200.
17. Cf. Quartum anatema, em: Mansi XIII, 400.
18. Horos, in: Mansi XIII, 377BC.
19. Ibid., 377C.
20. Cf. Santo Ireneu, Adversus Haereses 1, 10, 1; I, 22. 1; em: Sources Chrétiennes (= SCH) 264, p. 154-158; 308-310; Tertuliano, De praescriptione 13, 16; em Corpus Christianorum, Series Latina (= CChL), I, p. 197-198; Orígenes, Perì Archòn, Pref. 4, 10, em SCh 252, p. 80-89.
21. De Baptismo IV, 24, 31; em: Corpus Scriptorum Ecclesiasticorum Latinorum (= CSEL) 51, p. 259.
22. Sobre o Espirito Santo, VII 16, 21.32; IX 22, 3; XXIX 71, 6; XXX 79, 15; em SCh 17 bis, p. 298.300.322.500.528.
23. Ibid. XXVII 66; 1-3, p. 478-480.
24. Cf. Horos, in: Mansi XIII, 378E.
25. Discurso sobre as imagens III, 3, em: PG 94, 1320-1321; e B. Katter, Die Schriften des Johannes von Damaskos, vol. III (Contra imaginum calumniatores orationes tres), em: "Patristische Texte und Studien" 17, Berlim-Nova Iorque, 1975, III, 3, p. 72-73.
26. Dei Verbum, 9.
27. Ibid., 8.
28. Ibid., l0.
29. Sobre o Espírito Santo, XVIII 45, 19, em: SCh 17 bis, p. 496; Nicéia II, Horos, em: Mansi XIII, 377E.
30. Cartas de São Gregório Magno ao Bispo Sereno de Marselha, em: MGH, Gregorii I Papae Registrum Epistularum II, 1, lib. IX, 208, p. 195 e II, 2, lib. XI, 10, p 270-271; ou em: CChL 140A, lib. IX, 209, p. 768 e lib. XI, 10, p. 874-875.
31. Cf. Teófano, Chronographia ad annum, 6221, ed. C. de Boor I, Leipzig, 1883, p. 404; ou PG 108, 821C.
32. Carta de Adriano I aos Imperadores, em: Mansi XII, 1062 AB.
33. Horos, em: Mansi XIII, 377E.
34. Ibid., 377D.
35. Teodoro Studita, Antirrheticus, 1, 10, in: PG 99, 339D.
36. Cf. Carta de Adriano a Carlos Magno, em: MGH, Epistulae V (Epistulae Karolini Aevi, t. III), p. 5-57; ou PL 98,
1248-1292.
37. Cf. Sacrosanctum Concilium, 111, 1; 125; 128; Lumen Gentium, 51; 67; Gaudium et Spes, 62, 4-5; e também Código de Direito Canônico, cân. 1255 e 1276.
38. Sacrosanctum Concilium, 122-124.
39. Ibid., 125.
40. Discurso sobre as imagens, I, 16, em: PG. 94, 1246A: e ed. Kotter 1, 16, p. 89.
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