CONSTITUIÇÃO APOSTÓLICA
SPIRITUALI MILITUM CURAE
DO PAPA JOÃO PAULO II
COM A QUAL SE DÁ UMA NOVA
REGULAMENTAÇÃO À ASSISTÊNCIA
ESPIRITUAL AOS MILITARES
I. OCASIÃO
Desde sempre, com exímia solicitude e em modo proporcionado às diversas exigências, a Igreja procurou atender à cura espiritual dos Militares. Estes, com efeito, constituem um específico grupo social e, "pelas peculiares condições da sua vida" (Christus Dominus, 43), quer voluntariamente façam parte de modo estável das Forças Armadas, quer a elas sejam chamados por lei durante um tempo determinado, têm necessidade de uma concreta e específica forma de assistência pastoral. A esta exigência, no curso dos tempos, a sagrada Jerarquia e, em particular os Romanos Pontífices, pelo seu dever de serviço ou seja de "diaconia" (Lumen Gentium, 24), têm providenciado em cada caso e do melhor modo, com uma jurisdição mais conforme às pessoas e às circunstâncias. Desse modo, foram pouco a pouco constituídas estruturas eclesiásticas nas várias Nações, à frente das quais era colocado um prelado munido das necessárias faculdades (Bullarium Romanum, Torino 1868, t. XV, p. 410) .
A Sagrada Constituição Consistorial estabeleceu nesta matéria normas prudentes com a instrução Sollemme Semper, de 23 de abril de 1951 (AAS 43 [1951] 562-565). Agora, porém, deve-se dizer que chegou o tempo de rever essas normas, para poderem ter maior força e eficácia. A isto leva, antes de mais nada, o Concílio Vaticano II, que abriu o caminho para realizar, de modo mais adequado, iniciativas pastorais especializadas (cf. Presbytrorum Ordinis, 10), e tomou em atenta consideração a intervenção da Igreja no mundo contemporâneo, mesmo no que toca à edificação e à promoção da paz em todo o mundo. Nesta linha, aqueles que prestam o serviço militar devem considerar-se "como ministros da segurança e da liberdade dos povos", pois, "se cumprem com o seu dever retamente, concorrem também eles verdadeiramente para a estabilidade da paz" (Gaudium et Spes, 79) .
Isto é aconselhado também pelas grandes mudanças que se deram não só no que diz respeito à profissão militar e às suas circunstâncias de vida, mas também no significado comum atribuído pela sociedade do nosso tempo à natureza e às tarefas das Forças Armadas na realidade da vida humana. A este passo, enfim, conduziu a promulgação do novo Código de Direito Canônico, que, em verdade, deixou inalteradas as normas relativas à assistência pastoral dos militares até aqui em vigor (cf. Codex Iuris Canonici, cân 569), as quais, contudo, são hoje oportunamente revistas, para que da sua equilibrada composição derivem frutos mais abundantes.
Normas, porém, dêste gênero não podem ser idênticas para todos os Países, não sendo igual, nem absoluta nem relativamente, o número de católicos empenhados no serviço militar e sendo muito diversas as circunstâncias em cada um dos lugares.
Convém, portanto, que sejam aqui estabelecidas certas normas gerais, válidas para todos os Ordinariados militares - chamados até agora de Vicariatos Castrenses - que devem depois ser completadas, no quadro desta lei geral, com os estatutos instituídos pela Sé Apostólica para cada Ordinariado.
II. NORMAS
São portanto estabelecidas as seguintes normas:
I § 1. Os Ordinariados militares, que podem também chamar-se castrenses e que são juridicamente assimilados às dioceses, são circunscrições eclesiásticas especiais, regidas por estatutos próprios emanados pela Sé Apostólica, nos quais serão precisadas mais em pormenor as prescrições da presente Constituição, mantendo-se válidas, onde existem, as Convenções estipuladas entre a Santa Sé e os Estados (cf. Codex Iuris Canonici, cân 3) .
§ 2. Onde as circunstâncias o aconselhem, ouvidas as Conferências Episcopais interessadas, serão erectos pela Sé Apostólica os novos Ordinariados militares.
II § 1. À frente do Ordinariado militar é colocado, como próprio, um Ordinário normalmente constituído na dignidade episcopal, o qual goza de todos os direitos e está sujeito a todas as obrigações dos Bispos diocesanos, a não ser que conste diversamente pela natureza das coisas ou pelos estatutos particulares.
§ 2. O Sumo Pontífice nomeia livremente o Ordinário militar ou institui ou confirma o candidato legitimamente designado (cf. Codex Iuris Canonici, cân 163, 377 par. 1) .
§ 3. Para que possa aplicar-se com todas as suas forças a esta específica missão pastoral, o Ordinário militar será normalmente liberto de outros ofícios que comportem cura de almas, a menos que exigências particulares de uma Nação aconselhem outra coisa.
§ 4. Entre o Ordinário militar e as outras Igrejas particulares deve existir um estreito vínculo de comunhão e uma coordenação de forças na ação pastoral.
III O Ordinário militar faz parte de direito da Conferência Episcopal da Nação onde o Ordinário tem a sua própria sede.
IV A jurisdição do Ordinário militar é:
1º pessoal, tanto que pode exercer-se em relação às pessoas que fazem parte do Ordinariado, mesmo se por vezes se encontram fora dos confins nacionais;
2º ordinária, tanto no foro interno como no foro externo;
3º própria, mas cumulativa com a jurisdição do Bispo diocesano, visto que as pessoas pertencentes ao Ordinariado não deixam de ser fiéis daquela Igreja particular, de cujo povo fazem parte em razão do domicílio ou do rito.
V Os ambientes e os lugares reservados aos militares estão sujeitos, primária e principalmente, à jurisdição do Ordinariado militar; de modo secundário, porém, estão também sujeitos à jurisdição do Bispo diocesano, isto é, quando faltem o Ordinário militar e os seus Capelães: em tal caso, quer o Bispo diocesano quer o pároco agem por direito próprio.
VI § 1. Além das pessoas contempladas nos seguintes parágrafos 3 e 4, o presbitério do Ordinariado castrense é formado pelos sacerdotes, tanto seculares quanto religiosos, que, dotados das necessárias qualidades para desempenhar proficuamente este especial ministério pastoral, e com o consentimento do próprio Ordinário, desempenham um serviço no Ordinariado militar.
§ 2. Os Bispos diocesanos e também os competentes superiores religiosos concedam ao Ordinariado castrense, em número suficiente, sacerdotes e diáconos idôneos para esta missão.
§ 3. O Ordinário militar pode, com a aprovação da Santa Sé, erigir um seminário e promover às ordens sagradas no Ordinariado os seus alunos, uma vez completada a específica formação espiritual e pastoral.
§ 4. Também outros clérigos podem ser incardinados no Ordinariado castrense, segundo as normas do direito.
§ 5. O conselho presbiteral tenha os seus estatutos, aprovados pelo Ordinário, tendo em conta as normas dadas pela Conferência episcopal (cf. Codex Iuris Canonici, cân 496) .
VII No âmbito que lhes é atribuído em relação às pessoas que lhe são confiadas, os sacerdotes que são nomeados capelães no Ordinariado gozam dos direitos e são obrigados a observar os deveres dos párocos, a não ser que, pela natureza das coisas ou pelos estatutos particulares, conste diversamente; cumulativamente contudo com o pároco do lugar, em conformidade com o Art. IV.
VIII Quanto aos religiosos e aos membros das Sociedades de vida apostólica que prestem serviço no Ordinariado, preocupe-se com o Ordinário para que eles perseverem na fidelidade à vocação e ao carisma do próprio Instituto e mantenham estreitos laços com os seus Superiores.
IX Devendo todos os fiéis cooperar na edificação do Corpo de Cristo (cf. Codex Iuris Canonici, cân 208), o Ordinário e o seu presbitério procedam de modo que os fiéis leigos do Ordinariado, tanto a nível pessoal como em forma associativa, desempenhem a sua função como fermento apostólico, e também missionário, entre os outros militares com quem vivem.
X Além dos que estão determinados nos estatutos, em conformidade com o Art. I, pertencem ao Ordinariado militar e estão sob a sua jurisdição:
1º Os fiéis que são militares, e também aqueles que estão ao serviço das Forças Armadas, contanto que sejam ligados pela norma das leis civis;
2º Quantos compõem as suas famílias, isto é, os cônjuges e os filhos, mesmo maiores, se habitam na mesma casa, e também os parentes e as pessoas de serviço que, igualmente, habitam na mesma casa;
3º Os que frequentam escolas militares ou estão internados ou prestam serviço nos hospitais militares, nas casas para anciãos ou noutros institutos similares;
4º Todos os fiéis, homens e mulheres, membros ou não de um Instituto religioso, que desempenham de modo estável funções a eles confiadas pelo Ordinário militar ou com o seu consentimento.
XI O Ordinário militar depende da Congregação para os Bispos ou da Congregação para a Evangelização dos Povos e, segundo os casos, trata as questões com os competentes Dicastérios da Cúria Romana.
XII De cinco em cinco anos o Ordinário militar apresentará à Sé Apostólica a relação sobre a situação do Ordinariado, segundo a fórmula prescrita. De igual modo o Ordinário militar está sujeito às obrigações da Visita ad limina, segundo o direito (cf. ibid., cann. 399 et 400, parr. 1 et 2; cf. etiam Sacrae Congr. Consistorialis Decr. De Sacrorum liminum visitatione a Vicariis Castrensibus peragenda, die 28 febr. 1959: AAS 51 [1959] 272-274).
XIII Nos estatutos particulares, respeitadas as Convenções estipuladas entre a Santa Sé e os Estados, caso existam, serão precisados, entre outros, os seguintes pontos:
1º em que lugar serão colocadas a Igreja do Ordinário castrense e a sua cúria;
2º se deve haver um ou mais vigários-gerais e que outros oficiais de cúria devem ser nomeados;
3º o que toca à condição eclesiástica do Ordinário castrense e dos outros sacerdotes ou diáconos adscritos ao Ordinariado militar, durante o cargo e ao deixarem o serviço, como também as prescrições e salvaguardas acerca da sua situação militar;
4º como se há de providenciar em caso de sede vacante ou impedida;
5º que dizer acerca do conselho pastoral quer do inteiro Ordinariado quer do local, tendo presentes as normas do Código de Direito Canônico;
6º que livros se devem ter tanto no que respeita a administração dos Sacramentos como para o "status" das pessoas, segundo as leis universais e as prescrições da Conferência Episcopal.
XIV Acerca das causas judiciais envolvendo fiéis do Ordinariado militar, competente em primeira instância é o Tribunal da diocese na qual tem a sua sede a cúria do Ordinariado militar, nos estatutos se designará de modo permanente o tribunal de apelação. Se porém o Ordinariado tem o seu tribunal, os recursos de apelação devem ser feitos ao tribunal que, com a aprovação da Sé Apostólica, o mesmo Ordinário Castrense tenha designado de modo estável (cf. Codex Iuris Canonici, cân. 1438 n. 2) .
Quanto é prescrito nesta Nossa Constituição entrará em vigor na data de 21 de julho do corrente ano. As normas de direito particular porém conservar-se-ão em vigor na medida em que concordem com esta Constituição Apostólica. Os estatutos de cada Ordinariado castrense, redigidos em conformidade com o Art. I, deverão ser submetidos à revista da Santa Sé dentro de um ano que se deve contar a partir da mesma data.
Queremos que estas nossas disposições e normas sejam válidas e eficazes agora e no futuro, não obstando, se fosse necessário, as Constituições e as Ordenações Apostólicas emanadas pelos Nossos Predecessores, e qualquer outra prescrição mesmo digna de particular menção ou derrogação.
Dado em Roma, junto de São Pedro, a 21 de abril do ano de 1986, oitavo do Nosso Pontificado.
PAPA JOÃO PAULO II
Copyright © Dicastero per la Comunicazione - Libreria Editrice Vaticana